sexta-feira, 10 de julho de 2009

Pentecostalismo não é Misticismo

Sou assembleiano, batizado com o Espírito Santo, creio em milagres, minha vida é um milagre, tenho visto muitos milagres. Mesmo assim, sou contra — por que a Palavra de Deus também o é — a manifestações como “cair no poder”, “unção do riso”, “unção do leão”, “unção da lagartixa” e outras aberrações que ora ocorrem no meio dito pentecostal.

Nasci num lar pentecostal e cresci em meio a visões, revelações, etc. E, por mais que eu tenha esse lado contestador — que não é exclusividade minha, posto que Paulo (2 Co 11.3-15) e o próprio Senhor Jesus (Mt 23; Ap 2-3), só para exemplificar, também se opuseram a heresias e modismos —, creio na multifacetada obra do Espírito Santo mediante a diversidade de dons, ministérios e operações (1 Co 12.4-11). Isso mesmo. Sou pentecostal, mas não sou místico.

Na adolescência e na juventude, tive contato com todo o tipo de manifestação pentecostal e pseudopentecostal. Sou assembleiano, graças a Deus, desde 1985. Sei o que são cultos no monte; conheço vigílias do “reteté”, que na minha época não recebiam esse adjetivo grotesco. Fui dirigente de duas congregações em São Paulo e conheci todo o tipo de crente, dos mais frios aos mais fervorosos; desde os mais céticos até os mais fanáticos.

Por graça de Deus, sou ministro do evangelho desde 1992, se bem que o reconhecimento do título de ministro só ocorreu em 1997, na Assembleia de Deus do Belenzinho em São Paulo. Na ocasião, tendo o meu nome apresentado pelo saudoso pastor e pregador Valdir Nunes Bícego — que também era contrário ao misticismo —, fui consagrado ao santo ministério numa reunião presidida pelo pastor José Wellington Bezerra da Costa.

Que fique claro que não sou um teórico, frio, gelado, como alguns amargos internautas têm sugerido, anonimamente ou mediante e-mails falsos, como pude constatar. Tenho plena convicção bíblica e experiencial de que o “cair no Espírito” e outras manifestações que ora ocorrem em nosso meio não têm aprovação divina. Não estou sendo apressado em minhas conclusões. Falo com conhecimento de causa, depois de ter analisado cuidadosamente as bases e os resultados das tais manifestações.

Como já disse neste espaço e em meus livros, pessoas sinceras e tementes a Deus estão certas de que o “cair no Espírito” e a “unção do riso” são bíblicas. E algumas se apegam ao fato de manifestações similares às mencionadas terem ocorrido no avivamento da Rua Azusa, em Los Angeles, no começo do século XX, e no início da Assembleia de Deus no Brasil.

É claro que as experiências relacionadas com o início do Movimento Pentecostal não se comparam com as aberrações que vemos hoje. Naquela época, não houve golpes de paletó, sopro “ungido”, empurrões, uivos, rugidos, latidos, pessoas rastejando pelo chão, etc. Ademais, não se deve supervalorizar as experiências vividas pelos pentecostais do começo do século XX, a ponto de as equipararmos às incontestáveis verdades da Bíblia. Devemos, sim, respeitar os pioneiros, mas a nossa fonte primacial, precípua, de autoridade tem de ser a Palavra de Deus.

O “cair no poder”, a “unção do riso” e manifestações afins não se coadunam com os princípios e mandamentos contidos em 1 Coríntios 14. Essas manifestações não edificam (v.12); contrapõem-se ao uso da razão, necessário num culto genuinamente pentecostal (vv.15,20,32); levam os incrédulos a pensarem que os crentes estão loucos (v.23); e promovem desordem generalizada (vv.26-28,40).

Muitos defensores dessas manifestações dizem que estão na liberdade do Espírito, porém o texto de 1 Coríntios 14 também não avaliza toda e qualquer manifestação. No culto genuinamente pentecostal deve haver julgamento, discernimento, análise, exame (vv.29,33). Por isso, no versículo 37, está escrito: “Se alguém cuida ser profeta ou espiritual, reconheça que essas coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor”.

Tenho observado que os propagadores e seguidores dessas manifestações exóticas, em sua maioria, são pessoas indóceis, dispostas a humilhar e ridicularizar quem pensa diferente, ainda que tenha fundamento bíblico. E escrevo este artigo porque muitos estão querendo me intimidar, me xingando e me ameaçando, de modo covarde e anônimo. Veja que tipo de gente promove as manifestações em análise. Elas não merecem crédito nenhum.

Não tenho dúvidas de que o Senhor opera milagres extraordinários em nosso meio. Ele é o mesmo (Hb 13.8). Mas o que temos visto hoje são práticas viciosas e repetitivas. Jesus curou um cego com lodo que fez com a sua própria saliva, porém Ele não metodizou esse modo de dar vista aos cegos. A obra de Deus surpreende, impressiona, positivamente; deixa todos maravilhados (Lc 5.26). As falsificações são viciosas, premeditadas, propagandeadas, a fim de que o milagreiro receba a glória que é exclusivamente de Deus (Is 42.8).

O “cair no poder”, a “unção do riso” e outros “moveres” não têm apoio das Escrituras e não podem ser equiparados ao batismo com o Espírito Santo, com a evidência inicial de falar em outras línguas, mencionado com clareza na Palavra de Deus (Jl 2.28,29; Mc 16.15-20; At 2; 10; 19; 1 Co 12-14, etc.). Por isso, os defensores dessas falsas manifestações recorrem a passagens que nada têm que ver com o assunto.

Citam textos como 2 Crônicas 5.14 e 1 Reis 8.10,11 e dizem, com a boca cheia: “Os sacerdotes não resistiram a glória de Deus e caíram no poder”. Que engano! Veja o que a Bíblia realmente diz: “E sucedeu que saindo os sacerdotes do santuário, uma nuvem encheu a Casa do SENHOR. E não podiam ter-se em pé os sacerdotes para ministrar, por causa da nuvem, porque a glória do SENHOR enchera a Casa do SENHOR” (1 Rs 8.10,11).

Infelizmente, a frase “não podiam ter-se em pé” tem sido entendida como “caíram no poder”. Mas ela, na verdade, denota que os sacerdotes “não puderam permanecer ali”, o que fica ainda mais claro na versão Almeida Revista e Atualiza (ARA). Eles não suportaram permanecer no local ministrando! Não tinham como resistir a glória divina presente ali. Por isso, não permaneceram no local. Onde está escrito que eles caíram no poder?

Outro texto citado erroneamente em abono às manifestações em apreço é João 14.12, pelo fato de mencionar “coisas maiores” do que as realizadas por Jesus. Mas o termo grego meizõn, traduzido por “maiores”, em João 14.12, literalmente é “coisas maiores”. Já o vocábulo “obras” (gr. ergon) significa: “trabalho”, “ação”, “ato” (VINE. W.E., Dicionário Vine, CPAD, pp.764,827), e não “milagres” ou “manifestações”, estritamente.

Essas obras maiores incluem tanto a conversão de pessoas a Cristo, como a operação de milagres (At 2.41,43; 4.33; 5.12; Mc 16.17,18). Exegeticamente, são obras maiores em número e em alcance. Dizem respeito à quantidade em lugar de qualidade, como já demonstrei em outro artigo contido neste blog. João 14.12, por conseguinte, não avaliza truques, trapaças, experiências exóticas e antibíblicas, além de fenômenos “extraordinários” (cf. Dt 13.1-4; 2 Ts 2.9; Mt 7.21-23).

Considero importantes os milagres, mas, na hierarquização feita por Deus, a exposição da Palavra tem prioridade (1 Co 12.28; Jo 10.41). Os sinais, prodígios e maravilhas devem ocorrer naturalmente. E Deus precisa estar no controle. Mas hoje há muita imitação, falsificação, misticismo no meio dito pentecostal. Os super-pregadores brasileiros — que “fazem chover fogo líquido do céu” — têm como modelo o show-man Benny Hinn, que não merece crédito nenhum, como também já escrevi neste espaço.

O paradigma do povo pentecostal deve ser o Senhor Jesus Cristo, que andou na terra fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do Diabo porque Deus era com Ele (At 10.38). É perigoso quando resolvemos ter um ministério “sem limites”, em que nada pode ser contestado, à luz da Bíblia. Tudo deve, sim, ser regulado, controlado pelo Espírito Santo e pela vontade de Deus expressa em sua Palavra (Mt 7.15-23; 1 Jo 4.1; 1 Ts 5.21; 1 Co 14.29; Jo 7.24, etc.).

Reitero, concluindo este longo artigo: na Palavra de Deus não há nenhum fundamento para o “cair no poder”, a “unção do riso” e aberrações outras. O Senhor Jesus nunca derrubou ninguém. Concordo que algumas pessoas possam vir a cair por não suportarem a glória que estão sentindo, em determinado momento, mas sem perderem a consciência, como aconteceu com João, na Ilha de Patmos (Ap 1).

Em Lucas 4.35, está escrito: “E Jesus o repreendeu, dizendo: Cala-te e sai dele. E o demônio, lançando-o por terra no meio do povo, saiu dele, sem lhe fazer mal”. O Senhor não arremessa pessoas ao chão mediante sopros “ungidos” e golpes de paletó. Quem gosta de lançar as pessoas ao chão é o Diabo (Mc 9.17-27). Jesus, o maior Pregador que já andou na terra, e seus apóstolos — repito — nunca impuseram as mãos sobre pessoas para levá-las ao chão. Eles jamais sopraram sobre elas ou lançaram parte de suas roupas a fim de derrubá-las.

Em resumo: pentecostalismo não é sinônimo de misticismo.

Pela graça do Senhor Jesus, movido pelo amor de Cristo e com a ajuda do divino Consolador,

Ciro Sanches Zibordi

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